A concessão de refúgio político ao italiano Cesare Battisti, decidida na semana passada por Tarso Genro, ministro da Justiça, produziu uma daquelas ondas de alta tensão emotiva cujo efeito imediato é a radicalização contra e a favor da medida, situação em que os fatos passam a plano secundário. Sendo Tarso Genro quem é, um político de esquerda, militante socialista e com longa folha corrida de decisões tisnadas por suas convicções ideológicas, nada mais natural do que concluir que essas mesmas forças o levaram a conceder o benefício a Battisti. Alto dirigente de um grupo esquerdista radical, os Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), o italiano possui credenciais de sobra para atrair a simpatia de Tarso Genro. Ocorre que, nesse caso, contra todas as aparências, o ministro brasileiro pode estar certo. Durante duas semanas, Tarso Genro estudou em detalhes o processo da Justiça italiana que condenou à revelia Battisti à pena de prisão perpétua pela autoria de quatro homicídios cometidos entre 1977 e 1979. Genro concluiu que o julgamento não se sustenta em confissão, provas materiais ou periciais contra Battisti, que foi condenado tão-somente com base na acusação feita contra ele por um militante da mesma organização, Pietro Mutti. Ainda assim, há dúvida sobre as reais motivações de Mutti. Ele poderia ter incriminado Battisti apenas para ter direito aos benefícios da delação premiada – o que realmente ocorreu. Hoje Mutti vive com identidade trocada e em lugar não sabido. Com sua decisão, Tarso Genro comprou para o Brasil uma briga feia com o governo italiano. Em protesto, Ignazio La Russa, ministro da Defesa da Itália, ameaçou até se acorrentar à porta da embaixada brasileira em Roma. Não teria sido mais correto devolver Battisti e deixar que a própria Justiça italiana decida se é o caso de reabrir o processo e julgá-lo novamente? Genro acha que não, exatamente porque o único acusador de Battisti, Pietro Mutti, está desaparecido e não poderia ser convocado pela Justiça para, eventualmente, voltar atrás em seu depoimento. O ministro da Justiça disse em entrevista que, se surgirem provas consistentes contra Battisti, ele pode rever a decisão. Para que Tarso Genro fixe seu nome na história da pasta como um autêntico humanista, falta ainda que lhe caia nas mãos um caso em que o acusado seja de extrema direita e ele demonstre a mesma disposição de buscar provas e reparar injustiças com que brindou o esquerdista Battisti.
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